A EDUCAFRO Brasil diz:
As organizações sociais afros precisam lutar, com força máxima, para a aplicação do método VAAR em 100% . É uma das formas de recuperar a década perdida. VAMOS?

Economia / Ricardo Henriques

Ricardo Henriques – Articulista

Financiamento da educação precisa de mais equidade

É um bom momento para fazer o balanço do Fundeb e aprimoramentos que consolidem a ação do Estado no enfrentamento da desigualdade
19/06/2023 04h30 Atualizado 19/06/2023

Combater nossas desigualdades, com impactos profundos e deletérios na sociedade, na economia e na democracia, requer um compromisso incontornável com a geração de oportunidades para todas e todos. Para isso, são fundamentais estratégias robustas pró equidade desde a educação básica. Nesta agenda, o Novo Fundeb – fundo que redistribui recursos entre entes federativos, aprovado pelo Congresso Nacional em 2020 – tem grande contribuição a dar.

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Um dos mecanismos indutores criados no Fundeb para mudar o quadro vigente de desigualdades é a chamada Complementação “VAAR” (Valor Aluno/Ano por Resultados), uma transferência adicional da União aos estados e municípios de acordo com o cumprimento de condicionalidades associadas à política educacional e ao avanço de indicadores de aprendizagem e atendimento escolar.

A Complementação VAAR começou a ser distribuída em 2023 e crescerá até alcançar cerca de R$ 6 bilhões (a valor presente) em 2026 – um instrumento com alto poder de indução.

Para estar habilitada ao recebimento da Complementação VAAR, uma rede pública de ensino deve cumprir condicionalidades básicas (critério técnico de seleção de diretores, 80% de participação no SAEB, currículo alinhado à BNCC, lei do ICMS Educação aprovada no estado e redução de desigualdades socioeconômicas e raciais) e melhorar os resultados de acesso à escola e de aprendizagem em língua portuguesa e matemática.

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Nesse contexto, o fato de que apenas 34% das redes de ensino estão elegíveis para receber tal recurso evidencia o tamanho de nosso desafio nacional. Dos 3.674 entes federativos que não receberão a Complementação VAAR neste ano, 2.738 não cumprem a condicionalidade de redução das desigualdades socioeconômicas e raciais, que é essencial para transformar a educação brasileira.

Alcançar a dimensão de equidade da Complementação VAAR requer que os entes federados concedam prioridade política e estruturem medidas técnicas eficazes para diminuir a distância de oportunidades entre os estudantes.

Importante pontuar que não há viés regional nem regressividade socioeconômica no dado reportado acima. Estudos preliminares do Instituto Unibanco indicam que as regiões brasileiras estão proporcionalmente representadas no conjunto de redes de ensino que não cumprem a condicionalidade específica de redução das desigualdades.

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O Índice de Desenvolvimento Humano municipal (IDHm) médio é o mesmo entre o grupo que cumpre e o que não cumpre tal condicionalidade, o que demonstra um desafio generalizado. Isso evidencia que precisaremos de estratégias de ação afirmativa desde a educação básica em todo o país, sendo o financiamento uma dimensão crucial, mas, evidentemente, não a única.

Ao olharmos para a distribuição efetiva dos valores da Complementação VAAR em 2023, é possível perceber que sua atual fórmula de cálculo produz progressividade racial e socioeconômica, com maior valor aluno/ano para os municípios com maior presença de estudantes negros e para os municípios de menor IDHm.

Esse cenário denota que, além de induzir o correto caminho da equidade (em particular na dimensão racial, por vezes negligenciada), a Complementação VAAR é equilibrada e favorece redes de ensino de contextos mais vulneráveis. Uma conquista como política pública que devemos consolidar.

Ainda assim, é possível aprimorar seus mecanismos para incentivar o aumento da qualidade e da equidade na educação. Em primeiro lugar, é importante ajustar o critério de equidade racial e socioeconômica referido à aprendizagem. Nesse sentido, cabe alterar a perspectiva de comparar médias de desempenho entre grupos sociais de estudantes (como é feito hoje) por uma métrica que capture melhor a perspectiva de direitos – por exemplo, os percentuais de aprendizagem adequada definidos por nível socioeconômico e raça/cor.

Em segundo lugar, a equidade também deve ser considerada na parte da fórmula de cálculo que trata do atendimento escolar, sinalizando justiça social no acesso à escola. Por fim, é positivo ampliar o peso da variável equidade na aprendizagem na fórmula da Complementação VAAR.

Este ano temos uma janela de oportunidade para trilhar esse caminho. Governo Federal e Congresso Nacional têm a missão de revisitar alguns elementos da Lei Federal nº 14.113/2020, que regulamenta o Novo Fundeb, tais como os fatores de ponderação das matrículas no mecanismo geral da política.

Esse é um momento propício para fazer, em simultâneo, o balanço do Fundeb até aqui e realizar aprimoramentos que consolidam e fortalecem a ação do Estado brasileiro no enfrentamento de desigualdades estruturais.

*Ricardo Henriques, economista, é superintendente-executivo do Instituto Unibanco e professor

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