A caminhada é longa, mas nunca andamos sós. O que aconteceu na Bahia foi mais que um encontro: foi o reafirmar de um compromisso ancestral com a nossa gente, com o nosso saber e com a nossa terra.

O som dos tambores em Salvador, entre 24 e 26 de setembro, não era apenas festa. Era chamado. Era a voz dos nossos ancestrais ecoando, reunindo mais de 350 dos nossos para o I Encontro Regional de Educação Escolar Quilombola do Nordeste. Era o nosso povo se aquilombando para traçar o futuro. E nós, da Educafro Brasil, que somos parte deste chão e desta luta, estávamos lá, ombro a ombro, fortalecendo a trincheira e reafirmando que a educação, para nós, é e sempre será um ato de libertação.

O tema “Educação Escolar Quilombola é direito! Planejar e resistir para os próximos 10 anos” não foi apenas um lema, foi a síntese da nossa jornada. Em cada roda de conversa, em cada fala potente de uma liderança, em cada ideia trocada nos grupos de trabalho, o que se via era a força de um povo que sabe de onde veio e para onde quer ir.

 

Na Encruzilhada dos Saberes, a Afirmação da Nossa Ciência

 

Há séculos tentam nos convencer de que nosso conhecimento não é válido, de que nossa ciência é “crendice”. Mas nós sabemos a verdade. Sabemos que a sabedoria dos nossos mais velhos, que cura com as folhas, que entende os ciclos da terra, que ergue casas de pau a pique, é tecnologia ancestral de ponta.

A educação que queremos e construímos parte daí. Ela combate o epistemicídio – o assassinato do nosso conhecimento. Nossas escolas precisam ser o espelho da nossa identidade, não a máscara do colonizador. A Escola Nacional Nego Bispo de Saberes Tradicionais, celebrada no encontro, é a materialização do que nossos mestres, como o grande Nego Bispo, sempre disseram: nosso saber tem valor e precisa ser a base para formar os nossos. É a encruzilhada onde o conhecimento acadêmico encontra o saber da terra, e juntos, criam uma potência para o nosso povo.

 

Nossos Direitos no Papel: Da Conquista à Efetivação

 

As leis que garantem uma educação diferenciada para nós não foram presentes. Foram arrancadas com muita luta. As Leis 10.639/03 e 11.645/08, assim como as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Quilombola, são ferramentas de luta que conquistamos. Agora, nossa batalha é para que cada artigo saia do papel e se torne realidade no chão de cada escola, em cada território.

O diálogo com o MEC durante o encontro foi um momento de pressão estratégica. Ouvimos sobre os avanços, como a inclusão de professores e obras quilombolas no PNLD, e celebramos. Mas, como bem nos lembra a caminhada de gigantes como Givânia Maria da Silva, seguimos vigilantes. Cobramos e continuaremos cobrando, pois direito conquistado é para ser efetivado.


 

Fortalecendo o Aquilombamento: Ocupe seu Lugar na Luta

 

Essa jornada precisa de cada um de nós. A luta pela educação quilombola é a luta por todo o nosso povo. Veja como fortalecer essa corrente:

  1. Fortaleça os Seus: Conecte-se com os núcleos da Educafro e outras organizações do movimento negro e quilombola na sua região. Apoie financeiramente, seja voluntário, some sua força. A base forte é o que sustenta a nossa caminhada.
  2. Faça o Conhecimento Circular: Leve essa discussão para dentro da sua casa, do seu terreiro, da sua associação, da sua igreja. Compartilhe os textos, vídeos e livros abaixo. Nossa maior arma contra o apagamento é a nossa própria voz, multiplicada.
  3. Ocupe os Espaços de Poder: Pressione as secretarias de educação da sua cidade e do seu estado. Pergunte, cobre, participe de conselhos. A política institucional também é um campo de batalha que precisa ser ocupado por nós.
  4. Seja Guardião da Nossa Cultura: Valorize, consuma e divulgue a produção dos nossos. Leia autores negros e quilombolas, assista aos nossos filmes, ouça nossas músicas. Financiar a nossa cultura é financiar a nossa revolução.

Para Aprofundar a Caminhada: Nossas Referências

 

 

Artigos e Pesquisas

 

  • “Educação Escolar Quilombola no Brasil: Legislação, Práticas e Desafios”: Busque por artigos com este tema em bases como SciELO e Google Scholar para encontrar pesquisas recentes de universidades brasileiras.
  • Relatórios da CONAQ: O site oficial da CONAQ é fonte primária de informação e luta. Acompanhe.
  • Cadernos SECADI (MEC): O Ministério da Educação publicou diversos materiais sobre educação para as relações étnico-raciais que servem como base para a nossa luta por direitos.

 

Audiovisual

 

  • Documentário “Nossos Passos Seguirão os Seus – O Legado de Nego Bispo” (2024): Fundamental para entender o pensamento de um dos nossos maiores mestres. Disponível no YouTube da CONAQ.
  • Canal da CONAQ no YouTube: Mergulhe nos vídeos, lives e documentários. É formação política na veia.
  • “Jonas e o Circo sem Lona” (2015): Um olhar sensível sobre as infâncias do nosso Nordeste, que nos lembra pelo que e por quem lutamos.

 

Bibliografia (para ter na cabeceira)

 

  • “Colonização, Quilombos: Modos e Significações” – De Antônio Bispo dos Santos (Nego Bispo). É mais que um livro, é um guia para o pensamento contracolonial.
  • “Educação e Luta: Por uma Pedagogia Quilombola” – Organizado por Givânia Maria da Silva. Uma coletânea que reúne vozes e práticas da nossa pedagogia.
  • “Quilombo, escola e currículo: um diálogo de saberes e fazeres” – De Ana Cristina de Souza. Uma análise profunda sobre a relação entre comunidade e escola.
  • “Pedagogia das Encruzilhadas” – De Luiz Rufino. Essencial para pensar uma educação a partir das nossas próprias lógicas e epistemologias.