Não se enganem. O que aconteceu em Brasília nos últimos dias não foram eventos políticos isolados. Foram os dois movimentos de uma mesma pinça, articulada para esmagar a integridade da nossa democracia e garantir que o poder continue nas mãos daqueles que sempre o usaram em benefício próprio. Enquanto uma mão do Congresso Nacional aprovava uma lei para anistiar corruptos e criminosos, a outra se movia para tentar amordaçar a única instituição capaz de barrar esse retrocesso: o Supremo Tribunal Federal (STF).

Diante desta dupla ameaça, nós da Educafro Brasil, junto ao Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), ao partido Rede Sustentabilidade e ao Deputado Federal Célio Studart (PSD-CE), não nos calamos. Fomos à linha de frente. Ajuizamos no STF, na madrugada do dia 1º de outubro, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) e um Mandado de Segurança para defender a Lei da Ficha Limpa e, com ela, o direito do nosso povo a uma representação política minimamente decente.

Nossa luta é para traduzir o que está em jogo, pois a corrupção tem cor e endereço. O dinheiro desviado é a vaga que falta na creche, o esgoto que corre a céu aberto na nossa rua, o leito de hospital que nunca chega. Entender essa batalha é uma questão de sobrevivência.

 

Ameaça 1: O Desmonte da Lei da Ficha Limpa

 

A recém-aprovada Lei Complementar nº 219/2025 é um ataque direto à mais importante conquista da cidadania brasileira no combate à corrupção. Nascida de uma iniciativa popular com mais de 1,6 milhão de assinaturas, a Lei da Ficha Limpa estabeleceu um filtro ético para a política. A nova lei, de forma deliberada, destrói esse filtro.

Em nossa ação no STF, demonstramos como a nova lei é um retrocesso devastador:

  • Uma Anistia para Criminosos Graves: A mudança mais perversa está na contagem do prazo de 8 anos de inelegibilidade. Antes, para crimes graves, o prazo começava após o cumprimento da pena. Agora, ele começa na data da condenação por órgão colegiado.

    Na prática, isso significa que o tempo que o criminoso passa recorrendo na justiça ou mesmo cumprindo sua pena será descontado. O resultado é absurdo: um condenado por latrocínio, tráfico de drogas, extorsão mediante sequestro ou organização criminosa poderá se candidatar imediatamente ao sair da prisão, sem qualquer quarentena política para provar sua reabilitação.

  • Um Vício na Origem: Como detalhamos nas ações, a lei nasceu de um processo legislativo fraudulento. O Senado Federal promoveu alterações profundas no texto que veio da Câmara dos Deputados, mas, em vez de devolvê-lo para a análise dos deputados como manda a Constituição (art. 65), enviou-o direto para a sanção presidencial. Esse desrespeito ao processo democrático é um dos fundamentos do nosso Mandado de Segurança e da nossa ADI.

 

Ameaça 2: A Tentativa de Amordaçar o STF

 

Não é coincidência. No mesmo dia em que essa aberração legislativa era finalizada, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovava um projeto para limitar o poder do STF. A proposta visa:

  1. Restringir o acesso à Justiça: Limita drasticamente o número de partidos políticos que podem questionar a constitucionalidade de uma lei no Supremo.
  2. Enfraquecer decisões de urgência: Dificulta a concessão de liminares por ministros individuais para suspender leis que violem a Constituição.

A conexão é óbvia e assustadora. O plano é aprovar leis imorais, que beneficiam a classe política mais corrupta, e, ao mesmo tempo, quebrar a ferramenta que a sociedade tem para se defender delas. É como vender o veneno e proibir o antídoto.

 

Nossa Luta é pela Justiça Social

 

Para nós da Educafro, esta não é uma batalha jurídica abstrata. É a luta pela alma do Brasil. A corrupção é um dos principais motores do racismo estrutural. Ela drena os recursos que deveriam ser investidos em políticas de reparação, em educação de qualidade para a juventude negra, em saúde para nossas famílias e em saneamento para nossas comunidades.

Permitir que a Ficha Limpa seja destruída é aceitar que os mesmos que desviam o dinheiro público voltem ao poder para desviar ainda mais. É por isso que fomos ao STF. É por isso que não recuaremos.


 

Como se Engajar e Apoiar Nessa Luta

 

A batalha nos tribunais é crucial, mas ela só será vencida com a força da mobilização popular. Você é parte fundamental desta luta. Veja como agir:

  1. Informe-se e Divulgue: Compartilhe este artigo e as informações sobre as ações no STF. Use suas redes sociais, seus grupos de WhatsApp e suas conversas para explicar o que está em jogo. Muitos não sabem da gravidade da situação. Seja a ponte.
  2. Pressione seu Parlamentar: Encontre os deputados e senadores do seu estado. Envie e-mails, comente em suas redes sociais e ligue para seus gabinetes. Pergunte como eles votaram na LC 219/2025 e exija que eles se posicionem publicamente contra o desmonte da Ficha Limpa e contra os ataques ao STF.
  3. Apoie as Organizações na Linha de Frente: Fortaleça o trabalho da Educafro Brasil, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) e de outras entidades da sociedade civil que estão liderando essa resistência. Considere fazer uma doação, ser um voluntário ou participar de seus eventos.
  4. Promova o Debate na sua Comunidade: Organize rodas de conversa na sua igreja, associação de bairro, coletivo ou local de trabalho. Traduza o impacto da corrupção para a realidade local. A conscientização da base é nossa maior arma.
  5. Fique de Olho no STF: Acompanhe as notícias sobre o andamento da ADI e do Mandado de Segurança. A visibilidade e a pressão da sociedade podem e vão influenciar a celeridade e o resultado do julgamento. Mostremos aos ministros que o Brasil está vigiando.

A democracia não é um presente; é uma conquista diária. E neste momento, ela exige que lutemos com toda a nossa força e inteligência. A hora é agora.


Referências Sugeridas para Aprofundamento:

  • Bibliografia:
    • REIS, Marlon & LIMA, Francisca. O Voto e a Ficha Limpa: A Conquista da Cidadania. Editora Gestão Pública, 2012.
    • ALMEIDA, Silvio. Racismo Estrutural. Editora Jandaíra, 2019.
    • Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
  • Audiovisual:
    • Documentário “O Processo” (2018), de Maria Augusta Ramos.
    • Canal da TV Justiça no YouTube, para acompanhar os futuros julgamentos.

 

Redação: O artigo se limita a reproduzir total ou parcialmente conteúdos relacionados ao tema não sendo diretamente uma reprodução de falas, posicionamento ou mesmo práticas da entidade Educafro Brasil.