Pela Nação Rubro-Negra, Por um Futebol Sem Racismo: A Luta da Educafro na Justiça

 

A Nação Rubro-Negra é, reconhecidamente, a maior do mundo. Uma torcida plural, apaixonada e que carrega em sua maioria as cores e a força do povo negro. É por respeito a essa torcida, e em defesa de toda a sociedade, que a Educafro (Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes) vem a público explicar e convocar a todos para a luta contra o racismo estrutural no futebol, materializada na Ação Civil Pública movida contra o Clube de Regatas do Flamengo.

Não se trata de um ataque ao clube ou à sua gloriosa história, mas de um chamado contundente à responsabilidade. O futebol, como maior manifestação cultural do país, não pode ser um espaço para a perpetuação de práticas discriminatórias. O silêncio e a omissão diante do racismo são coniventes e igualmente violentos.

A ação, que pede uma indenização de R$ 100 milhões, foi motivada por uma série de eventos que demonstram uma cultura institucional que, no mínimo, negligencia a gravidade do racismo. O estopim foi a fala de cunho eugenista do diretor da base do Flamengo, Alfredo Almeida, em julho de 2025, que afirmou que “a África tem valências físicas” enquanto “a parte mental está em outras zonas da Europa”. Uma declaração que ecoa as mais ultrapassadas e ofensivas teses raciais, inadmissível em qualquer contexto, ainda mais vinda de um formador de jovens atletas.

Contudo, este não é um caso isolado. A ação da Educafro aponta um padrão preocupante:

  • Recusa em assinar manifestos: A negativa do clube em se juntar a outras equipes da Liga do Brasil (Libra) em um manifesto antirracista.
  • Apoio a discursos brandos: A classificação como “adequado” do discurso do presidente da Conmebol, que minimizou a responsabilidade da entidade no combate ao racismo.
  • Um histórico de invisibilização: A forma como ídolos negros, fundamentais na construção da história vitoriosa do clube, como Adílio e Andrade, são frequentemente subvalorizados em comparação a outros atletas.

A repercussão do caso mostra a urgência do debate.

 

O que diz a imprensa e o objetivo da ação

 

O jornal O Estado de S. Paulo, em matéria de Rodrigo Sampaio, detalhou os fundamentos do processo, dando voz ao nosso diretor-presidente, Frei David. Reproduzimos parcialmente a reportagem para total transparência:

Educafro processa Flamengo por racismo institucional e pede R$ 100 milhões em indenização Entidade aponta falas eugenistas de diretor e omissões do clube e quer destinar valor a projetos de inclusão e apoio à comunidade afro-brasileira; clube não se manifesta

A Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro) entrou com uma ação civil pública na Justiça do Rio contra o Flamengo, citando racismo institucionalizado e omissões corporativas no combate à discriminação racial. O processo foi registrado no dia 21 de agosto e a entidade pede uma indenização de R$ 100 milhões. […]

A ação foi motivada pela declaração do diretor da base do Flamengo, o português Alfredo Almeida, em julho de 2025, que afirmou que “a África tem valências físicas” enquanto “a parte mental está em outras zonas da Europa”, consideradas de cunho racista e eugenistas. […]

Ao Estadão, Frei David, diretor-presidente da Educafro, afirmou que a ação tem um viés pedagógico e que a entidade vai novamente à Justiça em caso de racismo envolvendo outros clubes.

“Acompanhamos a questão do racismo no futebol brasileiro e internacional há 11 anos, desde 2014, e percebemos que quase nada está mudando. As ações atuais, como faixas e frases em camisetas, são consideradas insuficientes e não dá mais para brincar com a luta contra o racismo”, inicia.

“O Flamengo tem a maior torcida com pessoas negras em sua composição no Brasil. A ação é uma defesa dessa comunidade, que muitas vezes é tímida para falar a sua dor. É um processo profundamente pedagógico para levar a comunidade afro-brasileira a discutir e enfrentar o problema do racismo com profundidade”, completa.

 

O que é uma Ação Civil Pública e para onde vai o dinheiro?

 

É fundamental esclarecer: a Ação Civil Pública é um instrumento jurídico que visa proteger os direitos de toda a sociedade, não de um indivíduo ou de uma organização. O valor de R$ 100 milhões, caso a Justiça decida a nosso favor, não será destinado à Educafro.

Esses recursos são depositados em um fundo gerido pelo Ministério Público e devem, obrigatoriamente, ser investidos em projetos que visem reparar o dano causado à coletividade. Nossa sugestão, e trabalharemos para isso, é que o valor seja usado para financiar:

  1. Bolsas integrais para crianças e jovens negros em escolinhas de futebol do próprio Flamengo e de clubes parceiros em todo o Brasil.
  2. Bolsas de moradia e alimentação para estudantes negros de universidades públicas e do Prouni, fomentando a educação como ferramenta de transformação.

O objetivo não é punir por punir, mas transformar a realidade. É fazer com que a reparação pelo dano do racismo se converta em oportunidade e inclusão para a comunidade que é sistematicamente atacada.

 

Um Chamado à Ação: O Futebol Precisa Mudar

 

Faixas, hashtags e discursos protocolares não bastam mais. A luta antirracista exige ações concretas, políticas internas claras e tolerância zero com a discriminação. A presente ação se ampara em bases legais sólidas, como o Decreto nº 10.932/2022, que promulgou a Convenção Interamericana Contra o Racismo, e que obriga empresas e instituições a implementarem planos de inclusão.

Convocamos a imensa Nação Rubro-Negra a pressionar seu clube. Cobrem dos dirigentes uma postura ativa, transparente e verdadeiramente comprometida com a igualdade. Um clube gigante como o Flamengo deve ser líder não apenas nos gramados, mas também na luta pelos direitos humanos.

Conclamamos também os demais clubes, as federações e a CBF a olharem para este caso como um ponto de inflexão. O racismo não pode mais ser tratado como um “caso isolado”. É estrutural e precisa ser combatido em sua raiz.

A Educafro seguirá vigilante e atuante, usando todas as ferramentas legais para garantir que o futebol brasileiro seja um espaço de respeito para todos. Esta luta é por Vini Jr., por Aranha, por todos os atletas que sofreram e sofrem com o racismo. É pela torcedora e pelo torcedor negro que amam seu clube e merecem ser respeitados.

A bola está com a Justiça, mas a pressão por mudança é papel de todos nós.


Referências e Para Saber Mais: