Você sabia que, em mais de 10 anos, NENHUM juiz foi punido por racismo em processos abertos no Conselho Nacional de Justiça (CNJ)? Pois é, enquanto a população negra ainda é a maior vítima da violência e da desigualdade em nosso país, quem deveria garantir a justiça parece “fazer vista grossa” para atos racistas dentro dos tribunais.

Essa é a dura realidade revelada por um levantamento do Brasil de Fato, divulgado em 25 de setembro de 2020, que analisou dados do próprio CNJ. De 2010 a agosto de 2020, o CNJ recebeu nove denúncias de posturas racistas de juízes em suas decisões. E o que aconteceu com elas? Seis foram arquivadas, duas suspensas e apenas uma ainda estava em tramitação!

 

Casos de Arrepiar: Quando a Cor da Pele Vira “Prova” de Crime

 

A matéria de 2020 trouxe exemplos revoltantes que mostram como o racismo opera de forma explícita e descarada:

  • O caso da juíza Inês Marchalek Zarpelon: Em junho de 2020, ela afirmou em uma sentença que um suspeito praticava crimes “em razão da sua raça”, ou seja, por ser negro! Esse caso foi denunciado três vezes no CNJ, mas até agosto de 2020, dois processos estavam suspensos e o terceiro ainda tramitava.
  • A juíza Lissandra Reis Ceccon e o “estereótipo de bandido”: Em 2016, ao condenar um réu a 30 anos de prisão, ela destacou na sentença que o homem “não possui o estereótipo padrão de bandido, possui pele, olhos e cabelos claros, não estando sujeito a ser facilmente confundido”. Isso mesmo que você leu! O CNJ, em 2019, arquivou a denúncia contra ela, alegando que não houve “intuito ofensivo nem preconceituoso”.

 

O Que Dizem os Especialistas?

 

A impunidade nesses casos choca especialistas. Thiago Amparo, advogado e professor da FGV, era direto na época: “Está muito evidente a violação ética, dentro das regras da Magistratura, quando a raça de uma pessoa está associada ao cometimento de crime.” Para ele, o Judiciário não punia crimes de racismo porque não percebia o “intuito ofensivo”, o que é um absurdo.

Sheila Carvalho, coordenadora da OAB-SP, ia além: “Nós temos um judiciário extremamente racista, mas que não se enxerga como racista. Isso é muito grave.” Ela apontava para uma “naturalização” do racismo em todo o sistema jurídico brasileiro.

 

A Subnotificação e a “Sensação de Impunidade”

 

Com quase 20 mil juízes no Brasil (dado de 2020) e milhões de sentenças por ano, o número tão baixo de denúncias de racismo era um alerta. Thiago Amparo explicava que era um caso de subnotificação, pois havia uma “sensação de impunidade” que desestimulava as pessoas a denunciar. Afinal, para que denunciar se não vai dar em nada?

 

Dados de 2024/2025: A Luta Persiste, Mas a Punição Ainda é um Desafio!

 

As informações do artigo de 2020, infelizmente, continuam a ecoar na realidade brasileira. Embora o CNJ tenha avançado na criação de ferramentas de monitoramento e protocolos para julgamento com perspectiva racial, a efetividade na punição de magistrados por condutas racistas ainda é um ponto crítico.

Confira os dados mais recentes:

  • Baixa Representatividade Negra na Magistratura: A pesquisa “Justiça em Números 2024” do CNJ, divulgada em maio deste ano, revela que apenas 13,6% dos magistrados brasileiros se autodeclaram pretos ou pardos. Essa é uma queda em relação aos 14,5% registrados no ano anterior, mostrando que a magistratura continua sendo predominantemente branca (79,9%). Em fevereiro de 2025, o dado atualizado era ainda menor: 13,2% de negros e negras na magistratura.
  • Aumento dos Processos por Racismo: O Brasil registrou 5.552 processos criminais relacionados a racismo em 2024, o maior número da série histórica iniciada em 2020, representando um aumento de 64% em comparação com 2023. Essa é uma clara indicação de que o problema está sendo mais denunciado, mas a questão da punição dos magistrados persiste.
  • Novos Painéis de Monitoramento, mas desafios na Punição: O CNJ lançou, em novembro de 2024, um painel para acompanhamento de processos sobre crimes de racismo em todo o país, que já mostrava 11.620 processos em tramitação. Essa ferramenta é um avanço na transparência e no monitoramento, mas a efetividade da punição é o ponto central. Representantes do CNJ, em abril de 2025, ainda afirmavam que “combater o racismo exige identificar e nomear o problema”, o que indica que a “naturalização” do racismo no sistema jurídico ainda é uma barreira a ser quebrada.

 

A Luta por uma Justiça Justa e Antirracista Continua!

 

Essa matéria, de 2020, e os dados atuais nos lembram de um problema persistente. A Educafro Brasil segue na linha de frente, denunciando o racismo e lutando por uma justiça verdadeiramente justa para o povo negro. O conhecimento é uma arma poderosa nessa batalha. Não basta criar observatórios e regulamentar cotas se os atos racistas continuam impunes e os operadores do direito não se enxergam como parte do problema.


 

Para se Aprofundar e Fortalecer sua Luta:

 


Aqui estão algumas sugestões de materiais que podem te ajudar a entender melhor o racismo no Brasil e no sistema de justiça:

Livros:

  • “Racismo Estrutural” – Silvio Almeida: Uma obra fundamental para entender como o racismo se manifesta nas estruturas da sociedade.
  • “O que é racismo recreativo?” – Adilson Moreira: Analisa o racismo mascarado de “piada” e suas consequências.
  • “Pequeno Manual Antirracista” – Djamila Ribeiro: Um guia acessível para entender e combater o racismo no dia a dia.
  • “No seu pescoço” – Chimamanda Ngozi Adichie: Contos que abordam questões de raça e identidade.
  • “Torto Arado” – Itamar Vieira Junior: Romance que expõe as relações raciais e sociais no Brasil rural.

Artigos e Relatórios:

  • “Diagnóstico Étnico-Racial no Poder Judiciário” (CNJ): Busque as edições mais recentes deste diagnóstico para dados atualizados sobre a participação de pessoas negras no Judiciário.
  • “Características do racismo estrutural (re)produzido no Sistema de Justiça” (CNJ): Este relatório de 2020 é a base do nosso artigo e oferece uma análise aprofundada.
  • Artigos da Agência Pública, Brasil de Fato, The Intercept Brasil: Essas mídias costumam publicar investigações aprofundadas sobre racismo e direitos humanos.

Vídeos e Documentários:

  • “A Lei do Outro” (Globoplay): Documentário que aborda as leis e a justiça no Brasil sob a perspectiva racial.
  • Canal do CNJ no YouTube: O CNJ frequentemente realiza seminários e debates sobre a equidade racial no Judiciário. Busque por “Protocolo para Julgamento com Perspectiva Racial” e “Seminário de Pesquisas Empíricas Aplicadas às Políticas Judiciárias”.
  • Palestras e entrevistas de Conceição Evaristo, Sueli Carneiro, Ailton Krenak: Disponíveis no YouTube, trazem visões valiosas sobre a questão racial.
  • TED Talks sobre racismo e justiça: Busque por pesquisadores e ativistas negros.

Instituições e Plataformas para Acompanhar:

  • Observatório da Discriminação Racial no Futebol: Mesmo focado no esporte, mostra como a denúncia e a análise de dados são importantes.
  • Coalizão Negra Por Direitos: Movimento que articula diversas entidades na luta antirracista.
  • Geledés – Instituto da Mulher Negra: Importante fonte de pesquisa e atuação em defesa dos direitos das mulheres negras.
  • Redes sociais de advogados(as) e ativistas negros(as): Muitos compartilham informações e análises sobre o tema diariamente.

A luta contra o racismo no Judiciário é complexa, mas não podemos desistir. A Educafro Brasil continuará cobrando transparência, responsabilidade e, acima de tudo, que a justiça seja realmente para todos. Compartilhe esse conhecimento e junte-se a nós nessa batalha!

 

Artigo Original na integra: BRASIL DE FATO – Em dez anos, nenhum juiz foi punido por racismo em processos abertos no CNJ

Magistrada inocentada afirmou que suspeito não tinha “estereótipo de bandido, por ter pele, olhos e cabelos claros”

 Igor Carvalho 5.set.2020 às 17h47 São Paulo (SP)

 

por Redação: O artigo não representa diretamente posições ou falas da EDUCAFRO Brasil como instituição, este é um artigo, parcial, total ou interpretado de públicações repercutidas